Projeto de Lei 1.179-A de 2020 do Senado Federal, que fora aprovado recentemente na Câmara dos Deputados, traz a discussão entre direito de propriedade do cidadão e os direitos coletivos considerando atual situação de pandemia.

O artigo 11, caput e seu inciso II são o objeto da discussão:

 

Art. 11. Em caráter emergencial, até 30 de outubro de 2020, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), compete-lhe:

(…)

II – restringir ou proibir a realização de reuniões e festividades e o uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação da Covid-19, vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.

 

Um condomínio edilício é formado de partes comuns e partes privativas. Por partes comuns, entendemos todas aquelas de uso da coletividade dos condôminos da forma como permitido pela Convenção e Regimento Interno e que não podem ser vendidas em separado. Das partes privativas, entende-se pelas áreas de propriedade exclusiva do condômino e que sobre elas poderá exercer os direitos de usar, gozar, fruir, dispor e reaver de quem quer que a injustamente detenha ou tenha a posse.

Mesmo que o proprietário condômino seja o dono de seu apartamento, ainda assim ele está obrigado a respeitar a regra dos três S: sossego, salubridade e segurança. A questão então é qual o limite que se deve impor ao exercício da propriedade em respeito à salubridade e segurança necessárias para evitar a propagação da Covid-19?

A norma contida no artigo 11, inciso II autoriza o síndico a proibir o direito de uso da unidade privativa do condômino para prática de atos que em hipótese alguma a lei já vedou. A medida se justifica pela necessidade de se evitar aglomerações e é reflexo de normativos municipais que ordenaram fechamento de estabelecimentos que poderiam causar aglomerações e propagação exponencial do vírus. As medidas municipais são embasadas em suspensão de alvará de funcionamento de estabelecimentos e também da função primordial do estado de garantir o bem estar social da população. Seria justo permitir a um particular, no caso o síndico, receber o mesmo poder para restringir os direitos do proprietário?

A propriedade privada confere ao condômino o direito de usar de seu apartamento, desde que não implique em afetar o sossego, a salubridade e segurança dos demais possuidores e condôminos. A reunião de pessoas em uma unidade nunca fora proibida por lei, e assim não fora porque é constitucionalmente garantido ao cidadão o direito à propriedade privada e também de reunir-se pacificamente.

A discussão não é só de direitos, é também de princípios constitucionais e de deveres. Nem oito nem o oitenta estão certos, e transitória ou não, uma proibição desse patamar precisa ser muito discutida, já que qualquer excesso é passível de revisão judicial.

Não se aconselha ao síndico proibir toda e qualquer reunião seja a que fim servir, assim como não se aconselha ao condômino realizar, nesse momento, toda e qualquer reunião seja para que fim servir. O bom senso do síndico e dos condôminos é o mínimo que se espera nesse estado de exceção que vivemos.

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