A cultura brasileira preza muito pela realização do matrimônio, pelo menos este é o desejo de todos os pais e mais para os seus filhos. Um casamento saudável, próspero e duradouro. Contudo, é importante saber que como um negócio jurídico, ele tem seus efeitos e consequências.

O primeiro artigo do Código Civil que trata do casamento dispõe que “o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”1. Já fica então avisado, aos pretendentes, que o casamento tem como base a igualdade de direitos e deveres, ou seja, não é mais admitida a supremacia de um em face do outro, como se admitia há anos e anos atrás.

Ao falar em direitos e deveres, não temos como não abordar o regime de bens entre cônjuges, sendo que o código civil atualmente permite: separação obrigatória; comunhão parcial; comunhão universal; regime de participação final nos aquestos e separação de bens. Na eventualidade dos nubentes não escolherem o regime, a lei a eles impõe o regime de comunhão parcial:

 

Art. 1.640. Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.

 

No que tange aos bens do casal, devemos ressaltar que eles podem ser particular ou podem ser comum. Por bem particular, entende-se aquele que pertence exclusivamente a um dos cônjuges e bem comum aquele que pertence a ambos os cônjuges. Para cada um dos regimes existe uma regra própria para qualificar, que não adentraremos neste texto, pois o objetivo não é tratar da diferenciação dos regimes de bens.

O que nós trazemos a discussão aqui é especificamente a possibilidade de patrimônio adquirido em nome de um dos cônjuges poder responder por dívida contraída pelo outro cônjuge. A resposta vai ser sim e não!

Dois pontos aqui importantes: momento de constituição da dívida e momento de aquisição do bem.

No regime de comunhão parcial de bens, um cônjuge não responde por dívida anterior ao casamento, logo, seu bem particular também não irá responder. A dívida posterior, ainda que contraída por um dos cônjuges, se em proveito da família, pode gerar a penhora do bem comum e particular do cônjuge que a contraiu, e o particular do outro na razão do proveito que houver auferido:

 

Art. 1.663. (omissis)

§ 1º As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido.

 

Art. 1.664. Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal.

 

Regra parecida se aplica ao regime de comunhão universal de bens. No caso, não cabe a penhora se a dívida fora anterior ao casamento e se não tiver prova de reversão em proveito comum do casal. Já as dívidas contraídas na vigência do casamento por um dos cônjuges pode atingir o patrimônio do outro.

No regime de separação de bens (legal ou por escolha dos cônjuges), não há comunicação alguma tanto de bens quanto de dívidas, portanto, não há margem para penhora de bem particular de um em razão de dívida particular de outro.

O tema já foi enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça que assim se posicionou:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. CÔNJUGE. EMBARGOS DE TERCEIRO. MEAÇÃO. LEGITIMIDADE. DÍVIDA. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. SÚMULA N. 7/STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. O cônjuge só será parte legítima para opor embargos de terceiro quando não tiver assumido juntamente com seu consorte a dívida executada, caso em que, figurando no polo passivo do processo de execução como corresponsável pelo débito, não lhe é legítimo pretender eximir seu patrimônio como “terceiro”. Precedente da Corte Especial do STJ.

2. “Tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é a de que cabe ao meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, haja vista a solidariedade entre o casal” (AgRg no AREsp n. 427.980/PR, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/2/2014, DJe 25/2/2014).

3. Na espécie, o acórdão proferido na origem consignou que o autor não conseguiu afastar a presunção de corresponsabilidade pela dívida cobrada, declarando sua ilegitimidade para opor embargos de terceiros. Para se alterar o desfecho conferido ao processo, seria necessário reexaminar a prova dos autos, o que é inviável em recurso especial, a teor da Súmula n. 7/STJ.

4. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 790.350/ES, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 06/04/2017, DJe 18/04/2017)

 

Voltando ao começo deste texto, o casamento tem como base igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, o dever de um pagar pode em alguns casos se tornar também o dever de outro. A proteção e administração de um patrimônio particular e comum é algo de muita importância para ser relevado por um dos cônjuges, e na grande maioria dos casos conseguimos perceber que está é a causa do término de várias relações.

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Art. 1.511 do Código Civil.

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