Os contratos de compra e venda são tidos como contratos bilaterais. Bilaterais não por terem duas partes ou pessoas diferentes na relação, mas por envolver obrigações para ambas as partes. Aquele que promete vender, tem a obrigação de entregar o bem na forma como se encontrava ao tempo do negócio. Aquele que promete comprar deve pagar o preço que foi ajustado pelo bem, ao tempo e modo contratado.

Mas e quando um dos dois não cumpre sua obrigação, qual a consequência disso? Rescisão contratual, indenização por perdas e danos e vedação ao enriquecimento sem causa…

Nesse texto vamos trazer algumas situações decorrentes da rescisão do contrato de compra e venda de imóveis quando o comprador já estava na posse do bem e nele construiu benfeitorias, mas precisa, então, devolvê-lo ao vendedor. Assim, explicaremos como a indenização por benfeitorias pode ser compensada pela permanência durante tempo determinado no imóvel. Acompanhe!

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A indenização por benfeitorias

 

O Código Civil prevê a existência de três tipos de benfeitorias: necessárias, úteis e voluptuárias. Cada uma delas devidamente qualificada na própria lei:

 

Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias.

São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.

São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.

São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.

 

A título exemplificativo, benfeitoria necessária pode ser a troca de um telhado ou a construção de um muro de divisa. Esse tipo de obra tem como finalidade conservar o bem e evitar que ele se deteriore por chuvas ou por invasão de bandidos, por exemplo.

Benfeitoria útil podemos citar uma piscina. Não é necessário, mas quando construída aumenta e facilita o uso do bem, inclusive agregando valor.

Já benfeitoria voluptuária, podemos citar instalação de cortinas nas janelas. Servem para proteger do sol e dar privacidade, porém podem ser facilmente levantadas quando da desocupação do imóvel.

No caso da compra e venda de imóveis, quando o comprador exerce a posse do bem e nele acrescenta construção ou benfeitoria necessária ou útil, sendo a sua posse de boa-fé, terá direito a ser indenizado por elas, e reter a posse do imóvel até ser devidamente indenizado, conforme o Código Civil:

 

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

 

O pagamento de taxas de fruição

 

O exercício da posse do imóvel pelo comprador quando o contrato de compra e venda é rescindido faz com que ele tenha o dever de pagar taxa de fruição, uma espécie de aluguel pelo tempo de posse, evitando-se assim o seu enriquecimento sem causa, conforme destaca o Superior Tribunal de Justiça:

 

Nos termos da jurisprudência desta Corte, a utilização do imóvel objeto do contrato de compra e venda enseja o pagamento de aluguéis ou de taxa de ocupação pelo tempo de permanência, independentemente de quem tenha sido o causador do desfazimento do negócio.

Isso porque, segundo o entendimento prevalente das Turmas da Segunda Seção a respeito do tema, o pagamento de taxa de ocupação ou aluguéis tem fundamento jurídico na vedação ao enriquecimento sem causa do adquirente, retribuindo ao proprietário os valores correspondentes ao tempo que o possuidor utilizou bem alheio.

Por essa razão, os aluguéis ou a taxa de ocupação devidos pela resolução do contrato de imóvel não se enquadram na categoria perdas e danos, para cuja indenização se faz necessária a constatação de ato ilícito.

Realmente, por impedir o enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento, o pagamento de taxa de ocupação ou de aluguéis não depende sequer da aferição da boa-fé ou não do adquirente na posse do imóvel, sendo, pois, devido em relação à integralidade do período em que a citada posse foi exercida. (REsp 1854120/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/02/2021, DJe 11/02/2021).

 

Uma importante exceção que deve ser trazida aqui é a hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de terreno. Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, a rescisão de contrato de compra e venda de terreno não gera direito de cobrança de taxa de fruição, exceto se o comprador tiver construído algo no bem.

 

Pode a indenização por benfeitorias ser compensada pela fruição do imóvel?

 

Nesse contraponto de discussão, perdas e danos versus enriquecimento sem causa, o Superior Tribunal de Justiça ainda entende que deve haver uma harmonização entre os institutos de forma que “o direito de retenção assegurado ao possuidor de boa-fé não é absoluto [haja vista que] pode ele ser limitado pelos princípios da vedação ao enriquecimento sem causa e da boa-fé objetiva, de forma que a retenção não se estenda por prazo indeterminado e interminável” (REsp 613.387/MG, Terceira Turma, DJe 10/12/2008).

Com isso, o crédito que o adquirente possui pelas benfeitorias deve ser compensado com os valores referentes aos aluguéis ou taxa de ocupação do bem, aliás, por aplicação analógica do art. 1.221 do CC/02, que informa que as benfeitorias compensam-se com os danos”.

Vale destacar que o direito de retenção da posse não é uma vontade da parte, mas sim um direito assegurado por lei, ou seja, a posse exercida em razão da retenção das benfeitorias não decorre da relação contratual, mas da imposição legal.

Da mesma forma, o pagamento da taxa de fruição ou aluguel não precisa ser acordado para que seja devido. Uma vez que o contrato de compra e venda foi rescindido e o comprador permanece no imóvel, há a obrigação de pagar pela posse.

E havendo, de um lado, a obrigação de indenização por benfeitorias pelo vendedor e, do outro, a obrigação de pagar aluguel pelo comprador que permanece na posse do imóvel, tais valores podem ser compensados.

O ponto importante a ser destacado é que o direito de retenção da posse é legítimo somente até o limite do valor das benfeitorias, a ser compensado pelos aluguéis que são devidos, mas não são efetivamente pagos – justamente para que haja a compensação.  

Conforme a decisão, “o direito de retenção assegurado ao possuidor de boa-fé não é absoluto”. Isso significa que, mesmo detendo o direito de retenção, o possuidor deve agir dentro dos limites legais para evitar enriquecimento sem causa.

Então, os créditos recíprocos devem ser compensados de forma a equilibrar o direito de retenção no limite do benefício que os possuidores realizaram na propriedade alheia, de boa-fé, sem gerar enriquecimento sem causa.

No entanto, também merece destaque o fato de que, quando o contrato é declarado rescindido, a posse passa a ser ilegítima, pois é preciso voltar ao status quo ante, que seria devolver o imóvel ao vendedor e devolver o dinheiro ao comprador. Nesse caso, o direito de retenção é válido para a retenção do bem e não de exercício da posse propriamente dita.

 

Conclusão

 

As decisões abordam o equilíbrio entre o direito de retenção, o uso adequado da coisa retida, a vedação ao enriquecimento sem causa e a boa-fé objetiva, buscando estabelecer uma compensação justa entre as partes envolvidas.

O direito de retenção não é absoluto, e o exercício desse direito deve ser limitado aos valores correspondentes à indenização pelas benfeitorias. Esses valores devem ser compensados com o montante devido pela ocupação do imóvel alheio, ou seja, pelos aluguéis ou taxa de ocupação. Mas, uma vez rescindido o contrato, a posse não acordada passa a ser ilegítima e a compensação deve ser feita de outra forma.

A compra e venda de imóveis e terrenos é uma operação complexa e que envolve alto valor investido, na regra geral. Espera-se sempre que o contrato possa se resolver da forma como as partes pretendiam ao tempo da sua assinatura. Porém, situações das mais variadas podem acabar interrompendo esse negócio no seu meio, gerando obrigações para as partes.

Se você está enfrentando desafios em seu contrato de compra e venda, deixe seu comentário abaixo ou entre em contato com o nosso escritório. Estamos à disposição para atendê-lo.

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